E a relação entre aprender a ler e a falar? Essa relação é
importante no progresso intelectual de uma criança, os mecanismos de
aprendizagem. E quais fatores podem permitir que se reconheça um problema de
aprendizagem? Esse texto explica um pouco como se dá esse processo.
Por
volta dos 21 meses de idade, a maioria das crianças consegue pronunciar 100
palavras e começará, antes dos 2 anos de idade, a combinar essas palavras para
fazer frases curtas. Infelizmente, muitas crianças pequenas já apresentam
atraso nesse período.
Há um atraso no
desenvolvimento da linguagem expressiva quando uma criança de 24 meses possui
um vocabulário expressivo limitado (menos de 40-50 palavras) e ela não combina
as palavras. Cerca de 8 a 12% das crianças norte-americanas em idade
pré-escolar e 12% das crianças que começam a escola apresentam um atraso de
linguagem. Entre elas, de 25 a 90% recebem um diagnóstico de problema de
leitura (dislexia), um problema que progride e afeta de 10 a 18% de todas as
crianças em idade escolar.
A frequência dos
problemas de linguagem e seu impacto posterior na alfabetização e nas
habilidades de leitura testemunham a necessidade de intervenção precoce assim
que as dificuldades de linguagem são detectadas.
Aprender a falar é uma das
conquistas mais importantes e mais visíveis da primeira infância. Novas
ferramentas de linguagem significam novas oportunidades para a compreensão
social, para aprender a respeito do mundo, para compartilhar
experiências, prazeres e necessidades. Posteriormente, nos três primeiros anos
de escola, as crianças dão mais um enorme passo do desenvolvimento da linguagem
ao aprender a
ler. Embora sejam diferentes, esses dois domínios estão também
relacionados. As habilidades iniciais de linguagem estão associadas ao
posterior sucesso na leitura. Da mesma forma, a alfabetização e
as atividades pré-alfabetização podem contribuir para as competências de
linguagem da criança tanto nos anos pré-escolares como na escolarização
posterior.
Considera-se que crianças que têm dificuldades de fala e de
audição têm um comprometimento de linguagem. No Canadá e nos Estados Unidos,
estima-se que de 8% a 12% das
crianças em idade pré-escolar e 12% daquelas que estão ingressando
na escola têm algum tipo de comprometimento de linguagem. Os
estudos também mostram que de 25% a 90% das
crianças com comprometimentos de linguagem apresentam distúrbios
de leitura, definidos usualmente como pobre desempenho em leitura,
que ocorre após suficientes oportunidades para aprender a ler. A incidência de
distúrbios de leitura em crianças em idade escolar é estimada entre 10% e 18%.
Quando as crianças têm dificuldade de entender os outros e de se
expressar, não surpreende que surjam problemas de
ajustamento psicossocial e emocional. Crianças que apresentam
atraso ou desorganização da linguagem correm, portanto, maior
risco de apresentarem problemas sociais, emocionais e
comportamentais. As pesquisas demonstram igualmente que a maioria das crianças
que tem pobres habilidades
de leitura ao final do primeiro ano do ensino fundamental
continuará a ter dificuldades de leitura mais tarde.
Embora a natureza da atividade mental subjacente à aprendizagem
da linguagem seja amplamente debatida, há um consenso considerável de que o
curso de desenvolvimento da linguagem é influenciado por fatores
determinantes em pelo menos cinco áreas: social, perceptiva,
de processamento cognitivo, conceitual e lingüística. Da mesma forma, embora
existam diferenças individuais entre as crianças, o desenvolvimento da
linguagem tem uma sequência
previsível. A maioria das crianças começa a falar no segundo ano de
vida, e aos 21 meses de idade provavelmente conhece pelo menos 100 palavras e
é capaz de combiná-las em frases curtas. Entre quatro e seis anos de idade, a
maioria das crianças fala com sentenças gramaticalmente completas e
inteiramente inteligíveis. Suas primeiras sentenças são compostas por palavras
de conteúdo e, frequentemente, faltam termos com função
gramatical (por exemplo, artigos e preposições) e terminações das palavras (por
exemplo, indicadores de plural e de tempo verbal).
Embora exista uma sequência
previsível, a taxa de desenvolvimento da linguagem varia substancialmente de
criança para criança devido, primariamente, à interação complexa entre fatores
genéticos e ambientais.
A quantidade e o tipo de estimulação linguística
no lar e estresses
familiares, como abuso infantil, afetam o desenvolvimento
linguístico da criança. Da mesma forma, a qualidade da
interação entre um cuidador e uma criança – como brincar com
jogos de palavras ou ler livros – desempenha um papel importante nos resultados
da alfabetização. As habilidades das crianças progridem mais rapidamente e mais
prontamente em interações instrucionais caracterizadas por inputs sensíveis,
responsivos e não controladores por parte do adulto. Outros aspectos do comportamento
parental, tais como a participação frequente e regular em
atividades de aprendizagem e o provimento de materiais de aprendizagem
apropriados para a idade da criança, também favorecem os resultados da
alfabetização. Além disso, pais que dispõem de mais recursos (por exemplo, educação,
renda) têm maior probabilidade de oferecer experiências positivas de
aprendizagem para seus filhos pequenos. Entretanto, características
da criança (por exemplo, ordem de nascimento) também
desempenham um papel central em suas próprias experiências de aprendizagem,
sendo que primogênitos têm, em média, um vocabulário maior do que seus irmãos
mais novos.
Crianças que têm vocabulário expressivo limitado (menos de 40-50
palavras) e que não utilizam nenhuma combinação de palavras aos 24 meses são consideradas
como tendo desenvolvimento
lento de linguagem expressiva (Slow Expressive Language Development - SELD).
Essas crianças correm um risco maior de comprometimento de linguagem, que
persiste ao longo dos últimos anos da educação infantil e dos primeiros anos do
ensino fundamental. Além disso, crianças com distúrbios do desenvolvimento
da linguagem correm maior risco de apresentarem problemas
comportamentais posteriores, dificuldades acadêmicas, incapacidades de
aprendizagem, dificuldades sociais e distúrbios de ansiedade. O problema
comportamental mais comum é o Transtorno de Déficit de
Atenção com Hiperatividade (TDAH); os estudos mostram também taxas altas de
problemas de internalização, como timidez e ansiedade. Crianças com distúrbios
de linguagem são mais propensas a ter dificuldades com o
processamento fonológico, a aprendizagem fonológica e a alfabetização.
A consciência
fonêmica refere-se à capacidade de identificar, comparar e
manipular as menores unidades das palavras faladas: os fonemas. Durante o
primeiro ano de vida, as crianças são mais sensíveis a fonemas de seu idioma
nativo e menos sensíveis a diferenças
acústicas que não são relevantes para seu idioma. Aos sete
meses e meio, o aumento da resposta
cerebral das crianças aos contrastes de seu idioma nativo
prediz habilidades futuras de linguagem. Consciência fonêmica e habilidades
vocabulares são os melhores preditores de leitura e de
compreensão de leitura, respectivamente. Algumas crianças são suficientemente
competentes em escutar e falar, mas têm pouca capacidade de processamento
fonológico. Ao ingressar apresentarem distúrbios
de leitura. Há uma representação acentuadamente desproporcional de
crianças pobres e pertencentes a minorias
étnicas ou raciais entre as que apresentam dificuldades de
leitura.
Finalmente, o desenvolvimento de linguagem e a idade de
surgimento de combinações de palavras são comparáveis entre crianças
bilíngues e monolíngues.
Intervenções
precoces em linguagem durante a infância ou nos anos pré-escolares podem ter
impacto significativo sobre os resultados da criança. Há pelo menos quatro contextos
gerais nos quais a intervenção em linguagem pode ser
oferecida: individual, em pequenos grupos, na sala de aula e por meio de
capacitação dos cuidadores. Demostrou-se que quatro
estratégias de ensino de linguagem melhoram as habilidades
linguísticas das crianças. São elas: estimulação
de linguagem na fase pré-linguística, para ajudar as crianças a
fazer a transição entre comunicação não intencional e intencional; estimulação
de linguagem espontânea, que consiste em técnicas específicas
embutidas nas atividades e interações cotidianas da criança; interação
responsiva, que envolve ensinar os cuidadores a ser altamente
responsivos às tentativas de comunicação da criança; e estímulo
direcionado, caracterizado por estimulação, reforço e
retroalimentação imediata (feedback)
sobre a gramática ou o vocabulário, em sessões altamente estruturadas. Em
qualquer dos casos, é importante estabelecer
o cenário para a aprendizagem de linguagem, criando oportunidades
de comunicação, acompanhando a liderança da criança, construindo e
estabelecendo rotinas sociais.
Nas intervenções
em linguagem administradas pelos pais, estes são capacitados por
fonoaudiólogos para que se tornem agentes primários de intervenção, aprendendo
a facilitar o desenvolvimento de linguagem de seus filhos em contextos diários,
naturalísticos. (Isto difere de envolvimento parental, no qual a criança recebe
atenção direta do profissional e os pais desempenham um papel secundário de
apoio). Intervenções administradas pelos pais produziram progressos,
em curto prazo, no desenvolvimento das habilidades de
comunicação e linguagem em uma ampla gama de crianças em idade pré-escolar com
atrasos ou distúrbios de linguagem. No entanto, pouco se sabe sobre os efeitos
de longo prazo deste modelo, que tem boa relação custo-benefício.
O treinamento
de alta intensidade é uma estratégia de intervenção que visa
melhorar a atenção de crianças diagnosticadas com transtornos específicos de
linguagem. Considerando-se que o déficit de
atenção está associado a transtornos de linguagem em crianças pequenas, e
especialmente em meninos, o treinamento de alta intensidade envolvendo os pais
e a criança deve ser encorajado. Com base em estudos recentes, verificou-se que
esta intervenção melhora tanto a proficiência em linguagem quanto as
habilidades de atenção das crianças.
As iniciativas
de políticas sociais devem focalizar a identificação precoce
por um fonoaudiólogo,
a avaliação abrangente e o provimento de ambientes
altamente responsivos o mais cedo possível. Da mesma forma,
devem ser oferecidas capacitação
e educação adequadas a todos os que trabalham com crianças e
suas famílias, como fonoaudiólogos, interventores precoces, educadores infantis
e provedores de cuidados infantis. No entanto, ainda há diversos obstáculos a
serem superados, entre os quais medidas mais sensíveis de triagem/reastreamento
para identificar os vários tipos de distúrbios, chegar a um consenso sobre a
definição do caso, e promover o reconhecimento dos pais em relação aos
potenciais problemas dos filhos e à necessidade de procurar ajuda.
Referências:
Disponível em: <http://www.enciclopedia-crianca.com/desenvolvimento-da-linguagem-e-alfabetizacao/sintese> Acesso em 20 de abril de 2017